Um novo olhar para além da alta temporada

Na Costa Esmeralda, em pleno litoral centro-norte de Santa Catarina, Porto Belo e Bombinhas estão protagonizando uma transformação histórica no setor turístico. Por décadas, a economia local esteve fortemente atrelada ao ciclo da alta temporada, período que vai de dezembro ao Carnaval. Nesse intervalo, a região recebia milhares de turistas, lotava hotéis e pousadas, e movimentava restaurantes, bares e serviços em geral. No entanto, logo após a folia, o movimento caía drasticamente, deixando um rastro de estabelecimentos fechados e trabalhadores desempregados.

Agora, as duas cidades decidiram mudar a lógica. A aposta é na temporada estendida, uma estratégia que busca garantir turismo ativo o ano inteiro, reduzindo a dependência do verão e criando um ambiente mais estável para empresas, trabalhadores e investidores. Essa iniciativa resulta de um esforço coletivo que envolve gestões municipais, empresários, entidades de classe e organizações do setor de serviços. O plano prevê a diversificação de experiências, a valorização da identidade cultural, a promoção de eventos temáticos e a integração regional para fortalecer o destino de forma conjunta.

Enfrentando a sazonalidade

O problema da sazonalidade sempre foi um gargalo para destinos de praia. Durante três meses, há alta ocupação e grande geração de renda. Depois, inicia-se um período de retração que impacta a todos: comerciantes, prestadores de serviços, taxistas, guias turísticos e, sobretudo, trabalhadores que dependem de empregos temporários.

Com a criação da temporada estendida, Porto Belo e Bombinhas almejam oferecer um fluxo contínuo de atrações e atividades que mantenham o destino atrativo nos meses de baixa procura. Trata-se de um reposicionamento estratégico, alinhado às tendências do turismo global, que privilegiam experiências diversificadas e imersivas em detrimento de viagens restritas ao sol e ao mar.

Essa mudança abre espaço para que a economia local seja menos vulnerável a oscilações sazonais, garantindo previsibilidade para investidores, estabilidade para trabalhadores e uma experiência mais rica para o visitante.

Experiências diversificadas: além das praias

O novo modelo turístico prioriza a ampliação do cardápio de atrações:

• Bombinhas aposta em mergulho, observação da fauna marinha, trilhas ecológicas, esportes de aventura e gastronomia de base açoriana. A cidade, reconhecida como um dos melhores pontos de mergulho do Brasil, vem organizando experiências que unem lazer e preservação ambiental, atraindo não apenas turistas nacionais, mas também estrangeiros interessados em ecoturismo.
  
  

• Porto Belo direciona seus esforços para passeios náuticos, visitas a ilhas próximas, enoturismo em parceria com vinícolas da região e eventos culturais. Por ser tradicional porto de cruzeiros, a cidade aproveita essa característica para expandir a recepção de turistas internacionais fora do verão.
  
  

Além disso, ambos os municípios intensificaram a agenda de festivais e eventos temáticos: semanas gastronômicas dedicadas a frutos do mar, feiras culturais, campeonatos esportivos e encontros voltados à pesca artesanal. O objetivo é oferecer motivos concretos para o retorno dos visitantes ao longo de todo o ano, evitando que a região seja lembrada apenas pelo turismo de verão.

Hotelaria e gastronomia em transformação

Se antes era inviável manter equipes completas após o Carnaval, hoje os hoteleiros já vislumbram contratos mais longos e maior estabilidade de pessoal. Isso gera melhorias no atendimento e reduz custos de rotatividade.

Na gastronomia, o impacto também é expressivo. Restaurantes que costumavam encerrar as atividades durante o outono e inverno agora se mantêm abertos, explorando novos nichos de mercado. Além dos turistas, moradores e visitantes de cidades próximas, como Florianópolis, Itapema e Balneário Camboriú, se tornam público cativo. Os festivais de gastronomia temática — camarão, peixes frescos e pratos açorianos — já despontam como fortes atrativos para manter o calendário ativo.

Emprego, capacitação e novas oportunidades

Um dos reflexos mais importantes da temporada estendida é o impacto social. A oferta de empregos permanentes permite que trabalhadores tenham renda mais estável, diminuindo a dependência de contratos temporários.

Instituições como SENAC e SENAI vêm acompanhando esse movimento e já oferecem capacitação em áreas-chave, como:

• atendimento bilíngue;
  
  

• gestão de hospedagem e pousadas;
  
  

• gastronomia regional;
  
  

• marketing digital voltado ao turismo;
  
  

• condução de passeios ecológicos.
  
  

Segundo a empresária hoteleira Marina Oliveira, “o perfil do turista mudou: ele busca experiências, contato com a cultura e boa comida. Para atender a esse público, precisamos de profissionais qualificados o ano inteiro, e não apenas durante a temporada de verão”.

Regionalização como estratégia competitiva

Outro diferencial é a integração regional. Em vez de competir, Porto Belo e Bombinhas passaram a colaborar. Um exemplo é o Roteiro das Ilhas e Encantos, que conecta passeios de barco entre os dois destinos, incluindo áreas de preservação e pontos de mergulho. Essa união também se reflete em ações conjuntas de marketing internacional e em pacotes turísticos integrados, que aumentam a permanência média e elevam o gasto individual por visitante.

Essa estratégia amplia a competitividade da região frente a outros polos do litoral catarinense, consolidando a Costa Esmeralda como destino de destaque no cenário nacional e internacional.

Impactos econômicos de longo prazo

De acordo com a Secretaria de Turismo de Santa Catarina, a temporada estendida poderá gerar um aumento de até 25% na receita turística anual em cinco anos. Fora do verão, a média de ocupação hoteleira deve passar de índices inferiores a 20% para cerca de 50%, garantindo maior sustentabilidade financeira para empresários e maior arrecadação para os cofres públicos.

Esse cenário cria um ciclo positivo: mais segurança para investimentos em infraestrutura, tecnologia e marketing, que por sua vez fortalecem ainda mais a imagem do destino.

Sustentabilidade como compromisso central

Porto Belo e Bombinhas sabem que o turismo só será viável no longo prazo se caminhar lado a lado com a preservação ambiental. Por isso, reforçaram medidas como:

• controle do número de visitantes em áreas sensíveis;
  
  

• manutenção e monitoramento de trilhas;
  
  

• combate ao turismo predatório;
  
  

• estímulo ao uso de energias limpas em hotéis e restaurantes;
  
  

• campanhas educativas voltadas aos turistas.
  
  

A região reconhece que seu maior patrimônio é o conjunto de paisagens naturais preservadas, e que qualquer crescimento econômico deve respeitar esse diferencial.

Desafios a superar

Apesar dos avanços, alguns obstáculos permanecem:

• infraestrutura viária insuficiente, com gargalos em períodos de maior movimento;
  
  

• ausência de voos diretos, dificultando o acesso de turistas de outros estados e países;
  
  

• resistência cultural de parte do empresariado, ainda acostumado ao modelo concentrado da alta temporada.
  
  

Mesmo assim, especialistas garantem que a mudança é irreversível. O consultor em turismo e economia criativa, Carlos Mendes, resume: “o futuro do turismo está na diversificação e no combate à sazonalidade. Porto Belo e Bombinhas compreenderam isso e estão no caminho para se tornarem referência nacional”.

Impactos sociais: além da economia

Os efeitos da temporada estendida vão além da geração de renda. A iniciativa:

• favorece a inclusão de jovens e mulheres no mercado de trabalho;
  
  

• proporciona melhores condições de vida para a população local;
  
  

• reforça o sentimento de pertencimento e orgulho comunitário;
  
  

• fortalece a cultura e a identidade regional, tornando o turismo parte do cotidiano.
  
  

Conclusão

Porto Belo e Bombinhas demonstram que é possível reinventar o turismo de praia e transformá-lo em motor de desenvolvimento sustentável. Ao alinhar crescimento econômico, preservação ambiental e inclusão social, os municípios constroem um futuro no qual a temporada turística não se limita ao verão, mas se prolonga por todas as estações.

Essa mudança de paradigma não apenas reposiciona a região no mapa do turismo brasileiro, mas também inspira outros destinos a seguir o mesmo caminho. O desafio, daqui em diante, é consolidar as conquistas e garantir que moradores e visitantes colham os frutos de uma temporada que, pela primeira vez, promete nunca acabar.